A advogada, que ajudou a escrever o novo Código Florestal, percorre o Brasil e o mundo, a cidade e o campo, trabalhando na defesa do agro
Natural de Curitiba (PR), Samanta Pineda, 50 anos, tinha tudo para ser totalmente metropolitana, já que sempre morou e estudou na capital paranaense. Porém, as recorrentes férias em fazendas dos tios maternos no interior do estado a tornaram admiradora das atividades rurais. E assim o seu destino começou a ser traçado no agro.
Filha de pais separados, ela vivia somente com a mãe, que por vários anos, de novembro a fevereiro, deixava Samanta curtir as férias escolares nas fazendas dos tios para brincar com as primas da mesma faixa etária. Muito prestativa e curiosa, no verão (época de colheita e plantio), Samanta ajudava na lida diária das propriedades. “Eu passava parte do dia na fazenda de um tio e parte na de outro. Levantava cedo tirava leite, fazia fogo, limpava terreiro, levava marmita para o tio na roça, participava do que podia. Explorava ao máximo a oportunidade de fazer tudo durante esses meses. Depois voltava para cidade pensando: 'Nossa, o campo não tem férias, né?'", lembra.
O tempo foi passando, e Samanta optou por cursar Direito, pois queria ser juíza. Na faculdade, começou a se deparar com discursos em relação ao agro que não condiziam com a realidade por ela vivenciada na infância: “O agro desmata, o agro destrói, o agro envenena, o agro é escravocrata”. Incomodada, sentiu-se motivada a estudar a maior das reclamações: as questões ambientais do agro. “De quando entrei na faculdade, em 1995, até 2000, havia uma discussão forte referente à reforma do Código Florestal. Procurei estudar e entender essas leis. E assim começou minha carreira no direito ambiental”.
Samanta precisava ajudar as pessoas a formarem opinião e, para isso, traçou uma estratégia de ministrar palestras específicas para sindicatos rurais e cooperativas. Alguns exemplos de temas: “Áreas de preservação permanente dentro do agro. Qual é o impacto?", “Reservas legais, o que fazer?”. Em paralelo às palestras, ela pegava algumas pequenas causas em outras áreas para manter seu escritório de advocacia.
Em, 2006 após palestras no Sindicato Rural de Ponta Grossa, foi chamada para uma reunião com 200 pessoas, incluindo deputados federais. Um deles a convidou para fazer uma apresentação em Brasília (DF) e ela aceitou o desafio. “Dividi a passagem em 10 vezes, me preparei com nunca na vida e, no início de 2007, fiz a palestra. Logo em seguida, fui contratada pela Frente Parlamentar da Agropecuária para ajudar a reescrever o Código Florestal. E aí minha vida mudou!”.
Samanta e um grupo de especialistas e políticos começaram a fazer a primeira minuta do Novo Código Florestal, que foi amplamente discutido entre ambientalistas, ruralistas e outras partes interessadas. Assim, de consultora e palestrante, ela passou a trabalhar na defesa do agro, escrevendo o código, Lei de Competências Ambientais, políticas de biossegurança. “Desde então, não parei mais. Ajudava na legislação, os estados me chamavam e o escritório cresceu. Fizemos leis para Minas Gerais, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, o escritório passou a ter essa relevância em produzir leis ambientais em compatibilização com a produção e não em contradição”.
Apesar de sempre ter sido muito respeitada como mulher em um ambiente predominantemente masculino, o desafio foi ter que provar que era capaz e competente, no âmbito profissional. “Era preciso impor com certa dureza os meus conhecimentos dentro do Congresso, porque havia um certo receio por eu ser jovem e mulher. Isso foi muito forte!”.
Hoje, Samanta tem um escritório junto com cinco sócias: o Pineda & Krahn. Sediado em Curitiba (PR), ele atende o Brasil inteiro com consultorias ambientais para o agro – com filiais em Nova Iorque (EUA) e Bruxelas (Bélgica), porque o meio ambiente e agro brasileiro viraram focos de investimentos externos. “A gente faz consultoria desses investidores internacionais para conhecer a legislação brasileira. E continuamos as consultorias para desenvolver legislações brasileiras”.
Embora o foco seja no âmbito do direito, um trabalho mais intelectual, Samanta afirma: “Somos da 'botina' mesmo, não ficamos só no escritório. Quando o produtor, seja grande ou pequeno, tem algum problema ambiental, sobreposição, algum embargo que ele desconhece, uma multa de desmatamento, ele nos procura, vamos na fazenda seja em qual região do Brasil for. Tenho contato direto com esses produtores e vejo a evolução deles no conhecimento e valorização das leis ambientais. Também tenho relacionmento com ministros, deputados, executivos... Gosto desse pé no salto e pé na bota”.
Samanta atualmente mora em Brasília e, além de cuidar do escritório, é diretora institucional de dois canais do agro: Terra Viva e Agro Mais, do Grupo Band. Isso dá oportunidade para ela estar sempre presente em eventos e feiras do setor, acompanhando as tecnologias e inovações no campo.
Nos momentos de lazer, adora andar a cavalo, apreciar o barulho e o cheiro do mato, levantar cedo, ir em fazendas de parentes, de amigos. “Aquele cheirinho de relva, de café, de orvalho, escutar o barulho da 'bicharada', banho de rio, almoço da roça no fogão a lenha, colher a fruta, colher a hortaliça, as noites, a fogueira, a música sertaneja. Uma característica que o agro tem é colocar raízes no coração das pessoas, saímos do agro, mas o agro não sai da gente”.
A advogada tem um casal de filhos, Isadora, de 24 anos, e Eduardo, de 21 anos. Eles nasceram em um conceito muito urbano e tiveram menos oportunidades no meio rural. Mesmo assim, a paixão da mãe pelo agro de alguma forma tocou a filha, que está se formando em Biologia na UFSC, em Florianópolis (SC) e optou por seguir na área de emissão de carbono. “Tenho certeza que ela vai colaborar com agro para essa compensação de gás de efeito estufa”. O filho, que mora com ela em Brasília e trabalha no gabinete de uma senadora do Mato Grosso do Sul, defensora do agro, agora optou por também fazer biologia.
"Somos os três filiados ao De Olho no Trabalho Escolar, um movimento para mudar a educação brasileira em relação ao agro", diz Samanta, ressaltando que nossa população antipatiza o agro sem saber o porquê. "Começa no material escolar. Nele vemos recados subliminares sobre o agro ser desmatador, escravocrata, usar agrotóxico... Aquilo cresce com essas crianças. Como os professores não são preparados para falar bem do agro, sempre sou voluntária para mostrar às crianças o agro na prática".
Samanta ressalta a importância do papel da mulher na conscientização sobre o agro, desde o material do filho à qualquer oportunidade de esclarecimento. "Temos essa natureza da conciliação e não do confronto e precisamos usar isso em prol dos centros urbanos conhecerem o agro; saberem, por exemplo, que estamos no Ministério do Meio Ambiente, pedindo o combate do desmatamento ilegal – que injustamente recaiu sobre nós".