Em entrevista à CARAS Brasil, o ator Daniel Pereira abre o coração ao falar de luta da mãe contra o câncer e desafios de adaptar luto para o cinema
Publicado em 26/05/2025, às 17h53 - Atualizado às 18h52
Daniel Pereira(32) encara um novo desafio na carreira profissional e na vida pessoal com a estreia de Refúgio, filme que retrata uma parte pessoal de sua vida e é sua estreia como diretor e produtor. Em entrevista à CARAS Brasil, o ator explica como ressignifica luto pela mãe com filme inspirado em sua vida: "Muito delicado", declara.
Com o curta-metragem Refúgio, Daniel Pereira estreia não só como diretor, roteirista e produtor, mas também interpreta um dos papéis mais emocionantes e desafiadores de sua vida: o da sua própria vida. Inspirado na relação com a mãe, que morreu após lutar contra o câncer, o projeto é, para ele, mais do que uma realização artística. “É um processo de cura”, diz.
“Vi que essa história precisava ser um filme quando eu fiz o meu monólogo no teatro. As pessoas sempre falavam muito: 'Tem que fazer algum filme da sua história, sua história é muito linda, inspira muitas pessoas'. Sempre que eu falava da minha mãe, do nosso amor e conexão, sentia que a história tocava profundamente as pessoas”, relembra sobre a ideia do projeto.
Além de emocionar o público, Refúgio nasceu da necessidade de acolher a própria dor do intérprete: “A arte cura, né? Ela ajuda a gente a curar todas as nossas dores, os nossos desafios, medos, a ressignificar tudo. Então havia muito essa necessidade de fazer esse filme por conta disso também", reflete.
De acordo com o ator, escrever o roteiro foi um processo extremamente delicado e sensível, ao reviver momentos com a mãe trouxe lembranças difíceis e gatilhos emocionais: “Foram noites sem dormir porque realmente ficar acessando muito isso me deixou com muita ansiedade, me deu vários gatilhos, então foi um processo muito, muito, muito pesado, mas, ao mesmo tempo, foi um processo de cura”.
A força da história impactou inclusive quem participou da produção. “Toda a equipe teve muito cuidado comigo referente a isso porque eles sabem que acessa muitas dores, né? E foi muito interessante porque teve pessoas no set que perderam entes queridos também. Foram várias situações de pessoas do set que vieram falar pra mim que perderam alguém pro câncer e eu não sabia.”
Em meio a crises de ansiedade e fragilidade emocional, o intérprete encontrou apoio nos colegas de cena: "Larissa Maciel, que interpreta minha psicóloga no filme, também passou por esse processo. Eu não sabia, mas ela desabafou comigo, segurou a minha mão e falou: 'Conta comigo, a gente tá junto'. Isso é muito genuíno, é muito lindo”, revela sobre o acolhimento no set.
Além dos desafios emocionais, Daniel encarou a luta do cinema independente. Sem patrocínio e com uma equipe de 20 pessoas, Refúgio foi filmado com recursos próprios e muito esforço coletivo. Daniel não apenas atuou, como também coordenou a produção e direção, junto de Denise Sganzerla (42). O elenco reúne nomes como Larissa Maciel (47), Rodrigo Fagundes (54), Marilha Galla e Vini Rodrigues.
“Para mim, foi muito cansativo porque tenho que ser ator, roteirista, diretor e também tenho que estar na produção do curta. Tento sempre organizar todo esse movimento na direção antes, meio que deixei o processo todo organizado”, explica. Ainda assim, algumas gravações ultrapassaram qualquer planejamento emocional. "Teve uma cena em que fiquei três minutos chorando de soluçar o set em um silêncio sepulcral e eu chorando muito, muito, muito, sem conseguir parar, até que teve uma amiga que conseguiu me acalmar e me fazer voltar presente”.
Com fotografia de Rico Villares e direção de arte de Marilha Galla, o curta-metragem venceu os desafios: “Conforme eu ia trabalhando esse processo do filme, as coisas foram vindo até mim. O que a arte tem de mágica é isso. Ela vê quem dá o sangue por ela. A arte é muito honesta. Se tu entrega tua alma, ela vai te dar resultado. E acho isso genial”, conta Daniel.
Apesar de retratar a dor da perda, Daniel quis trazer leveza e esperança ao filme, focando no amor entre mãe e filho. “Minha mãe sempre tinha um sorriso muito honesto, muito lindo, assim, que contagiava todo mundo. Então, tem várias cenas que eram no momento de dor, mas que conseguiam trazer esperança e sorriso. São cenas que quero muito ter no filme, que não vão estar no curta.”
Além da emoção, ele também quis questionar padrões de masculinidade: “O homem chora sim, o homem sofre sim, o homem tem dor sim. Eu via muitos homens abandonando suas mulheres, muitos filhos abandonando suas mães, então quero fazer com que isso mude, com que eles entendam que é necessário, sim, cuidar de uma mulher. É preciso, sabe? Com tanto amor, com tanta delicadeza. E porque elas fazem isso pela gente, né? Então, a gente tem muito que aprender com todas as mães, com todas as mulheres”.
Embora a mãe não apareça fisicamente no curta, sua presença simbólica permeia toda a narrativa. “Falo como se ela estivesse presente em alguns momentos, e em alguns momentos eu me deparo com a ausência dela. Então, tudo se torna tão real". Para o longa futuro, Daniel antecipa que a personagem será vivida por uma atriz conhecida, embora prefira manter o nome em segredo por enquanto.
Refúgio ainda está em fase final de montagem, mas Daniel já mira os próximos passos. Ele planeja transformar o curta em longa-metragem, com novas cenas e a presença física da mãe interpretada por uma atriz conhecida — cujo nome ainda mantém em segredo.
“Já estou escrevendo o roteiro do longa. Vão ter várias cenas que quero colocar. Como no longa quero ter a minha mãe em figura, sendo representada por uma atriz. Tem momentos meus e da minha mãe referente a nós dois, a minha adoção por ela, as nossas memórias, os nossos conflitos, as nossas evoluções de mãe e filho, nossa lealdade um com o outro. Tem cenas incríveis que muitas famílias vão se identificar que não foram pro curta.”
Enquanto isso, ele prepara o lançamento do curta em festivais nacionais e internacionais. “Tenho o sonho de ver Refúgio no Festival de Gramado, de Tiradentes, no Festival de Cinema do Rio, de São Paulo... E por que não em festivais internacionais? Já participei de um filme que foi ao Oscar, quero ver esse filme chegando longe", relembra a participação em Ainda Estou Aqui.
Apesar da dor, Daniel enxerga a morte da mãe como um momento de beleza: “O final também tem que ser lindo. E a morte da minha mãe, por mais que ela tenha morrido nos meus braços, de mão dada comigo, foi linda a morte dela".
"Vi ela descansar, sabe? E eu agradeci a ela, consegui agradecer antes de ela partir. Agradeci por tudo e disse que ia ficar bem. Foi onde ela sentiu a confiança de que ia ficar bem, que eu ia estar bem. Tenho essa imagem guardada até hoje como algo único. Obrigado Deus, obrigado, mãe! Por ter me deixado viver isso de estar com você até o final", conclui.
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